Enquanto caminhava, pensava. E todo mundo faz isso quando caminha sozinho: pensa na vida, elabora pequenos diálogos com a própria consciência. Era o que ele fazia. Olhava para todos os lados, mas não fitava em ponto algum. Não se concentrava em nada além daquele pensamento. Nem o calor e as ruas cheias o distraíam. Pensava nela, mas com certo pesar. Só se daria conta, mais tarde, que enquanto pensava nela suas feições mudavam, fazendo assim parecer às pessoas ao seu redor um maluco. É que ele pensava nos dias em que haviam passado. No dia em que se conheceram, em que o sorriso dela havia tomado conta do ambiente. Ele lembrava dos beijos e abraços que acalentavam sua alma e o quanto ela era importante. Ele lembrava dos dois deitados falando. E como ela falava, contava seu dia, contava segredos, expunha seus medos. Contava-lhe filmes, músicas, amores. Ela também ouvia e com toda a calma cada história que ele contava, as vezes longas, por vezes engraçadas. Ele lembrava claramente da cara de interesse que ela fazia enquanto o ouvia. O pesar que acompanhava o pensamento era por a ter deixado escapar. E saber que a culpa era dele. Ela, é claro, não era perfeita. O irritava por vezes, era insegura e fazia disso uma tempestade. Tinha ciúmes, nada escandaloso. Ele hoje preferiria explicar-se à ela do que não tê-la. Mas preferiu afastá-la. Um desentendimento ou outro não eram nem de longe o fator determinante entre eles. Mas sim o fato de seus corpos se encaixarem na mais perfeita sintonia. Mas sim o fato de fazê-la sorrir ser uma das coisas mais gratificantes do dia. Mas sim a companhia engraçada, suave e necessária que ela continha. Ele não soube medir. Tirou-a de sua vida assim como colocou. Ela perdeu o chão mas depois se aprumou. Sabia o valor que tinha e foi sumindo vagarosamente do passado. E ele continuava ali, caminhando, com o pensamento nela.
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